A aterrissagem atlética no novo milênio

Como vimos na semana passada, a história do jeans nos anos 90 foi marcada tanto pela consagração do ítem no estilo vintage, quanto pelas emancipações da sua própria fisionomia original – mérito de uma competente resposta ao cenário de baixa do segmento predominante na época. Porém no decorrer dos anos 2.000 o jeans retomou sua trajetória de expansão no guarda-roupa global, desta vez visando acentuar o adjetivo “conforto” entre as suas qualidades: chegamos, enfim, à lógica mais atual que rege a indústria jeanswear global. Sem perder o visual lavado e a construção, o denim cedeu espaço para a inclusão de variações superiores de elastano, e ainda acrescentou à sua lista de qualidades, características semelhantes às da malha circular.



Com flexibilidade maior e permissão para realizar mais movimentos, a boa e velha five pockets “perdeu” algumas medidas, nos locais mais desejados: ajuste na barra, desenho mais preciso do entrepernas e acento nos quadris. Dessa lógica, descende o estabelecimento da modelagem skinny, já lançada na década anterior; mas desta vez figurando como fisionomia mais desejada, e portanto mais “espaçosa” nas coleções. Popularizaram-se também entre as araras do segmento, as variações com foco no desenho da silhueta; tais como a super skinny e a jegging – a mistura do visual do jeans com a calça legging, a qual representou um enorme passo para aproximar o conceito de activewear à linguagem da moda jeanswear.



Construções de elastano superiores, propagadas através de fashion movies repletos de movimentos e desafios, impulsionaram campanhas e lançamentos associando o jeans às mais desafiadoras atividades físicas. Assim, no ano de 2013 assistimos ao jeans realizando performances de pilates através da fabricante brasileira Tavex, escalando montanhas no ano de 2014 através do modelo Climbing Jeans lançado para prática do alpinismo pela marca Timezone, e até executando Pole Dancing na divulgação dos produtos da tecelagem Orta Anadolu. Todas, iniciativas respaldadas por misturas de denim com elastano de maior desempenho, diferenciadas por tramas em construções espirais, enaltecendo a performance do tecido e sua capacidade de retorno ao formato original sem deformação.





Em tempos onde o visual de moda composto pelo guarda-roupa essencial é um verdadeiro consenso nas coleções, as versões tecnológicas dedicadas ao denim com elastano seguiram sua saga evolutiva, evidenciando o foco no conforto como principal diferencial de moda para o segmento. O jeans, novamente herdou deste novo desejo coletivo, reformulações que extrapolaram os limites da sua composição e influenciaram também sua fisionomia, não apenas pelos formatos mais ajustados descendentes da familiaridade com a malha circular; mas também pelo diálogo do segmento com a linguagem dos tricôs e do moletom. Nessa linha, tivemos desde a migração de técnicas de lavanderia do jeans para malhas retilíneas, como também ocorrências inspiradoras do fluxo inverso: com incursões de ribanas e misturas de malhas tricôs finalizando o acabamento de barras, e diferenciando as calças do segmento. Além disso o toque e a textura passou a ser visto como um novo ponto de partida para diferenciação na superfície da peça.



Para comunicar a qualidade conforto em sua aparência mais literal, o jeans acrescentou entre as suas variações de modelagem, o próprio design da calça jogging, iniciativa que recebeu engajamento especial por parte do menswear, e novamente trouxe elementos esportivos e despojados para o seu universo. Sendo assim, se nas palavras de Karl Lagerfeld, “vestir moletom é sinal de derrota”, de acordo com o estilista também “é possível ser a pessoa mais elegante do mundo vestindo jeans e camiseta”. Como resultado desta alquimia, o jeans com “cara” de calça de moletom, acrescentou à peça um apelo irresistível de conforto, descartando da nova leitura qualquer sinal de descaso para com o estilo pessoal.



A partir da semana que vem, vamos olhar para o lado oculto história do jeans: aquele que não se refere ao visual, mas sim aos seus processos. Até lá!

VIVIAN DAVID | IMAGEM 1: VIVIAN DAVID / DEMAIS FOTOS: REPRODUÇÃO